A importância da comemoração dos 27 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), celebrado neste dia 13 de julho, precisa ser entendida como a superação de uma ausência de direitos das crianças e adolescentes antes da promulgação da Lei. O Brasil assegurou um novo tratamento de questões relacionadas à proteção de crianças e adolescentes, elevando esse público à categoria de sujeitos de direitos em situação de absoluta prioridade.
O ECA concedeu ainda protagonismo para a sociedade civil participar ativamente da construção de políticas públicas voltadas às crianças e adolescentes. A importância de diversos atores nesse debate pode ser ilustrado com a conquista da Lei 13.431, sancionada em 4 de abril de 2017. A Lei da Escuta Protegida estabelece o sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes vítimas e testemunhas de violência, até então tratado de forma marginal. Uma nova lei que visa dar voz às nossas crianças.
O projeto foi articulado pela Childhood Brasil junto com a Frente Parlamentar Mista de Promoção e Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente, UNICEF Brasil, Associação Brasileira de Psicologia Jurídica, ABMP, entre outras organizações e governos e foi apresentado pela deputada Maria do Rosário, com relatoria da deputada Laura Carneiro e das senadoras Marta Suplicy e Lídice da Mata. A nova lei, entre outros aspectos, inova por estabelecer mecanismos e princípios de integração das políticas de atendimento e propõe a criação de Centros de Atendimento Integrados. Considerada um novo marco para a causa da proteção da infância, como outros artigos do ECA, essa lei depende do apoio das instituições para o fortalecimento da rede de atenção à crianças e adolescentes no Brasil, visando o atendimento integrado – hoje ainda muito fragmentado nos municípios.
Nesse sentido, a Childhood Brasil entende que o país precisa avançar ainda mais para assegurar os direitos das nossas crianças previstos no ECA. No campo do Judiciário é necessário a ampliação de varas especializadas da infância para tratar a questão com a devida atenção. Na segurança pública a instalação de delegacias especializadas da criança e do adolescente. E os governos federal, municipais e estaduais devem estabelecer políticas de prevenção à violência contra crianças e adolescentes, em especial a violência sexual. Estão em curso no país experiências de atendimento integrado à crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, modelo que deveria ser expandido à todos os municípios brasileiros.
Temos ainda um desafio, a inclusão de debates contemporâneos ao ECA, consolidada as conquistas destes 27 anos, incorporando assim à legislação existente a reflexão sobre temas como diversidade, cultura do machismo (violência velada) e de gênero, entre outros pontos. O avanço da tecnologia requer também a prevenção e o enfrentamento da violência sexual em redes sociais (que podem se manifestar como sexting e grooming, por exemplo). Posicionamentos que precisam fazer parte de um novo debate.
Confira algumas conquistas do ECA nestes 27 anos:
Artigo 130 – Anteriormente, o abuso sexual não era nem sequer mencionado. O crime, pela antiga lei, era definido por maus tratos, castigos imoderados ou situações que ofendessem a moral. Hoje, além de citar a violência sexual, o Estatuto define as penalidades para quem praticar esse crime contra crianças e adolescentes.
Artigo 241 – A exploração sexual de crianças e adolescentes também não era abordada explicitamente no Código. A única menção era de “exploração em atividade contrária aos bons costumes”, sem especificar, de fato, o que isso significaria. Atualmente, com o ECA, o assunto é tratado e, por isso, mobiliza agentes do governo para combater o ato criminoso.
Artigo 236 – No passado, o Conselho Tutelar não existia. Ele surgiu junto com o ECA para ampliar a rede de proteção à infância. O antigo Código de Menores identificava crianças e adolescentes como menores de idade e, consequentemente, indivíduos com menos direitos. Agora, existem órgãos competentes para lidar com essa categoria, tanto na prevenção de violação de direitos quanto no enfrentamento.
Artigo 241-D – O Estatuto foi ampliado para proteção também no mundo virtual. Constranger ou instigar crianças e adolescentes para a prática de atos libidinosos em qualquer meio de comunicação é considerado crime e agentes do governo, inclusive, já trabalham para ampliar a rede de proteção na internet.
Artigo 232 – O antigo Código de Menores era voltado para as imposições que cabiam aos pais e responsáveis sobre diversas situações, sem considerar o desejo das crianças e dos adolescentes como seres autônomos. Com o ECA, o cenário mudou e agora há uma proteção ao desenvolvimento de cada indivíduo sem submete-los a possíveis traumas.