No mês de dezembro, quando a morte de Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016) completa um ano (no dia 14), o País ganha o primeiro documentário sobre este religioso que, por sua atuação, vem sendo considerado o mais importante cardeal brasileiro do século XX.
Cardeal arcebispo de São Paulo de 1970 a 1998, ele dedicou sua vida religiosa à melhoria da vida das comunidades carentes, ao mesmo tempo em que, determinado e incansável, lutou pelos Direitos Humanos durante todo o período da ditadura militar.
O documentário, que leva o título “Coragem! As muitas vidas do cardeal Dom Paulo Evaristo Arns”, tem pré-estreia marcada para 11 de dezembro, às 20hs, no Cine Caixa Belas Artes, em São Paulo, Capital.
Com 1h15’, o filme é resultado de um trabalho de quatro anos do jornalista Ricardo Carvalho. Com mais de 30 anos de atividades, ele foi repórter dedicado ao segmento de direitos humanos no jornal Folha de S.Paulo. Em seguida, e por um longo período, trabalhou na TV Cultura e na TV Globo. Mais recentemente tornou-se dono de uma produtora independente. O vasto material reunido por conta do trabalho e a proximidade com Dom Paulo o motivou.
“Por conta de minha experiência profissional acumulada em tantos anos de trabalho, achei que era hora de escrever e dirigir um documentário que pudesse expandir ainda mais o trabalho de Dom Paulo”, conta. Tomada a decisão, somou às informações já guardadas (reportagens, encontros com o cardeal, fotos, gravações) o vasto material garimpado graças a colaboradores como Maria Angélica Borsoi (secretária de Dom Paulo por mais de 40 anos), que lhe deu acesso à Sala Cardeal Arns; a família do religioso; veículos de informação como Folha de S. Paulo, TV Globo, TV Cultura, TV PUC e Rede Rua, que cederam material de arquivo. E ainda o Instituto Vladimir Herzog e a Globo Filmes, esta coprodutora do documentário.
“Foi um trabalho de ourivesaria”, contou Ricardo, “buscando a melhor fala, descobrindo coisas pouco conhecidas, entrevistando pessoas chaves.
Entre as revelações, o público saberá sobre o encontro de D. Paulo com o general Emílio Garrastazú Médici (presidente do Brasil entre outubro de 1969 e março de 1974); a correspondência de Dom Paulo com Fidel Castro; as visitas aos porões da ditadura militar em busca de presos, e reuniões em Brasília em busca de desaparecidos.
Três meses antes de morrer, D. Paulo assistiu a uma das versões quase prontas do filme. Ricardo lembra da emoção do ‘cardeal da esperança” ao abraçá-lo e a Ivo Herzog, diretor do Instituto Vladimir Herzog, que apoiou a realização do filme.
“Coragem”! tem roteiro e direção de Ricardo Carvalho; narração de Paulo Betti; produção da TVM-documentários, com apoio da Globo Filmes, GloboNews, do Itaú, Instituto Arrapya.
Livros sobre D. Paulo
Autor de dois livros sobre Dom Paulo, Ricardo Carvalho lançou o primeiro em 2009. Ele conta que “O Cardeal e o Repórter” é um livro que escreveu por sentir que precisava falar sobre o trabalho incansável que Dom Paulo, como arcebispo de São Paulo, realizou de 1970 as 1998 em favor dos pobres da cidade grande, dos humildes e dos humilhados, e da sua inquebrantável coragem de enfrentar os militares durante os 20 anos da ditadura brasileira”.
No segundo, “O Cardeal da Resistência – As muitas vidas do cardeal Dom Paulo Evaristo Arns”, editado pelo Instituto Vladimir Herzog em 2013, estão relatados os bastidores de 11 reportagens feitas por Ricardo para a Folha de S. Paulo entre 1975 e 1979. “Em uma delas, mostro como a pressão de D Paulo tirou do Manicômio Judiciário de Franco da Rocha o único preso político internado num manicômio de que se tem notícia durante a ditadura”, conta o jornalista e diretor.
D. Paulo Evaristo Arns
Filho de imigrantes alemães, nascido em 1921 na pequena Forquilhinha (Santa Catarina), D. Paulo era um dos 13 filhos do casal. De origem simples, ingressou no seminário franciscano e foi ordenado sacerdote em 1945. Mais tarde dedicou-se aos estudos brasileiros, latinos, gregos, e ainda à literatura antiga na universidade de Sorbonne, em Paris. Dedicado aos mais pobres, o religioso atuava pelo direito de todos ao exercício da cidadania. E lutou, intransigentemente, em prol dos Direitos Humanos.
Dom Paulo foi a voz clara em momentos difíceis pelos quais nossa sociedade passou durante a ditadura (1964-1985). Em 1972, criou a Comissão Brasileira Justiça e Paz, que articulou denúncias contra os abusos cometidos no período.
Em 1975, ano do assassinato do jornalista Vladimir Herzog nas dependências do DOI-CODI, em São Paulo (anunciado como suicídio), D. Paulo se ergueu ao lado de vários segmentos sociais pela justiça. Ele, ao lado do rabino Henri Sobel e do reverendo evangélico Jayme Wright realizou no dia 31 de outubro de 1975 o Culto Ecumênico que reuniu mais de oito mil pessoas na Catedral da Sé, em homenagem a Herzog.
Algum tempo depois o arcebispo iria capitanear, ao lado de Sobel e Wright, o projeto Brasil: Nunca Mais. O trio, contando com uma equipe de 30 pessoas iria, em seis anos e clandestinamente, levantar centenas de casos sobre vítimas, presos e torturados, processos e documentos oficiais sobre as vítimas do arbítrio.
O trabalho, publicado em livro com o mesmo nome, Brasil: Nunca Mais denunciou e mostrou ao mundo o que ocorria no Brasil. E tornou-se uma referência para pesquisadores.
O cardeal também foi o criador, em 1985, da Pastoral da Infância, com apoio de sua irmã, a médica Zilda Arns (que morreu vítima do terremoto no Haiti em 2010), realizando. Em abril de 1998, por força da idade, ele renunciou ao seu cargo, detendo o título de cardeal emérito de São Paulo. Ele faleceu em 2016 devido a uma broncopneumonia.
Serviço
Coragem! As muitas vidas de Dom Paulo Evaristo Arns
Documentário de Ricardo Carvalho
Produção: TVM-documentários; apoio Globo Filmes, GloboNews, Itaú, Instituto Arapyaú, Instituto Vladimir Herzog
Pré-estreia: 11 de dezembro de 2018
Local: Cine Belas Artes
Endereço: Rua da Consolação, 2423
Horário: 20hs.