Mais uma vez, a Câmara Municipal de Ribeirão Preto demonstra que suas decisões são tomadas sem a devida análise das consequências reais. Na Sessão Ordinária desta terça-feira (13), os vereadores aprovaram um Projeto de Lei substitutivo que restringe o uso de qualquer dispositivo eletrônico durante o período de atividade escolar, incluindo intervalos e atividades extracurriculares. O projeto, assinado pelo presidente do legislativo, Isaac Antunes (PL), recebeu apoio unânime entre os 21 votantes.
A justificativa? Alega-se que a lei municipal se faz necessária para adaptar normas estaduais e federais à realidade local. Entretanto, a aprovação ocorreu sem um debate aprofundado sobre questões cruciais, como o armazenamento dos celulares, a responsabilização por danos aos aparelhos e os impactos dessa medida em alunos com necessidades específicas, como aqueles que monitoram diabetes via aplicativos móveis.
Celulares Viram o “Grande Vilão”
A proibição vale para todas as escolas, públicas e privadas, e se estende até mesmo aos intervalos e atividades extracurriculares. O uso será permitido apenas para fins pedagógicos ou para alunos com deficiência. Em 30 dias, essa nova regra entra em vigor, mas as perguntas que realmente importam continuam sem resposta:
- Onde os celulares serão guardados?
- Quem se responsabilizará por eventuais danos ou furtos?
- E no caso de alunos que dependem do aparelho para monitoramento de saúde, como os diabéticos? A escola disporá de enfermeiros para acompanhar esses casos?
- Como impedir professores militantes de usarem suas aulas para catequese ideológica sem a possibilidade de registro por parte dos alunos?
A medida é apenas um reflexo do costume da política brasileira: quando não sabem resolver o problema, eles proíbem.
As Verdadeiras Urgências da Educação Ficam de Lado
Enquanto os vereadores batem no peito para dizer que estão “melhorando” a educação, 80% das escolas públicas sequer oferecem ensino de qualidade. De acordo com estudos baseados no Custo Aluno Qualidade (CAQ), apenas 19% das redes investem o mínimo necessário para proporcionar uma educação digna. As escolas precisam de formação continuada para professores, internet de qualidade, quadras esportivas, bibliotecas e laboratórios. Mas, claro, é muito mais fácil tirar o celular da mão dos alunos do que oferecer estrutura básica.
Se o mesmo empenho colocado na proibição de celulares fosse aplicado para resolver os reais problemas das escolas, a situação seria outra. O que dizer sobre:
- Desvalorização dos professores: Salários baixos, falta de reconhecimento e abandono por parte do poder público.
- Desinteresse dos alunos: Como esperar interesse se o ensino é ultrapassado e desconectado da realidade dos jovens?
- Violência e criminalidade nas escolas: Tráfico de drogas livre nos portões, sem segurança real ou medidas efetivas.
- Infraestrutura precária: Escolas sem materiais básicos, com banheiros insalubres e salas superlotadas.
- Falta de oportunidades para os alunos: Sem perspectivas de futuro, muitos jovens desistem antes mesmo de tentar.
O que a Câmara faz diante disso? Foca em uma proibição vazia e ineficaz, sem qualquer solução real para os problemas que destroem a educação brasileira.

A realidade ignorada pelos vereadores
A proibição se estende a todos os momentos do período escolar, com exceção de uso pedagógico ou por alunos com deficiência. Mas aí surge a primeira questão:
- Como será feito o armazenamento desses dispositivos?
- Quem garantirá que eles não sofrerão avarias?
- Caso um aluno entregue um celular já danificado e posteriormente alegue prejuízo, a escola será responsabilizada financeiramente?
A lei ignora também que, atualmente, muitos pais acompanham a saúde de seus filhos em tempo real por meio dos celulares. Crianças diabéticas, por exemplo, utilizam sensores conectados aos smartphones para monitorar seus níveis de glicose. A escola estará preparada para essa responsabilidade? Terá um enfermeiro disponível em cada unidade para suprir a ausência da tecnologia? Ou os pais devem simplesmente confiar que tudo correrá bem?
Proibir é Mais Fácil do Que Educar
Além de ignorar os problemas estruturais da educação, a Câmara de Ribeirão Preto também fecha os olhos para soluções reais que poderiam melhorar a vida dos alunos e professores. Se a preocupação é com distrações e disciplina, por que não incentivar atividades extracurriculares como bandas marciais, fanfarras e aulas de música?
Os celulares não são o problema. A falta de diálogo e de planejamento é. Proibir é sempre a saída mais fácil, mas quem assume as consequências dessa decisão? Alguém acredita que essa proibição será cumprida sem problemas, sem abusos e sem injustiças?
Os pais foram consultados? Os professores foram ouvidos? Os alunos tiveram alguma participação?
Se nem para o básico a população tem voz, como esperar mudanças reais?

Hipocrisia seletiva: fiscalização só quando convém
Curiosamente, o mesmo zelo que os vereadores demonstram ao coibir celulares dentro da sala de aula não se aplica a temas ainda mais sensíveis. Muitos professores se aproveitam da sala de aula para promover doutrinação ideológica, seja em política ou religião. O celular tem sido uma ferramenta valiosa para pais e responsáveis denunciarem esse tipo de abuso, garantindo que a educação não se transforme em militância.
Mas agora, com a aprovação dessa medida, professores ideologizados terão campo livre para disseminar suas crenças sem o risco de serem filmados. Assim, o que deveria ser uma medida para melhorar o desempenho acadêmico pode se tornar uma brecha para que doutrinadores atuem sem qualquer tipo de fiscalização.
Conclusão
A decisão da Câmara de Ribeirão Preto reflete a típica postura de vereadores que aprovam leis populistas sem considerar suas implicações reais. Sequer se preocuparam em ouvir especialistas em educação, pais e professores para entender a complexidade do tema. A proibição pura e simples do uso de celulares não resolve os problemas da educação, mas cria novos desafios e incertezas.
A política não deveria ser palco para medidas demagógicas, mas sim para soluções eficazes. Resta agora saber se os mesmos vereadores que aprovaram essa restrição estão dispostos a enfrentar as consequências quando os problemas aparecerem.
JORNALISTA AIELLO Especialista da área da matéria do portal em Ribeirão, o único portal independente da região que não recebe verbas públicas.


