Consorcio nordeste comprou 300 respiradores de empresa fornecedora de derivados da maconha

compraram 300 respiradores que nunca foram entregues de uma empresa especializada na venda de derivados da maconha

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Os nove estados que formam o Consórcio Nordeste estão na mira do senador Eduardo Girão (Podemos-CE), titular da CPI da covid-19 do Senado e autor do requerimento que resultou na inclusão de governadores e prefeitos entre os possíveis alvos da Comissão Parlamentar de Inquérito.

Em entrevista ao Correio, Girão nega que defenda os interesses do governo federal na CPI e diz que pediu a convocação dos secretários de Saúde do consórcio “porque muitos hospitais de campanha foram desmanchados antes da segunda onda da pandemia, quando a população mais precisava”.

O senador diz que os estados do consórcio devem prestar esclarecimentos à CPI, também, porque pagaram adiantado por 300 respiradores que não foram entregues.

A reportagem apurou que a Justiça da Bahia bloqueou R$ 48,7 milhões em contas da HempCare. O valor equivale ao que foi pago pelo consórcio pelos equipamentos. A empresa, que se apresentou como revendedora de uma fabricante chinesa de ventiladores pulmonares, é, na verdade, especializada na venda de óleos medicinais fabricados a partir da maconha. “O que é que tem maconha com covid e com respirador?”, questiona o senador Eduardo Girão. A seguir, os principais trechos da entrevista:

O senhor tem sido considerado um governista dentro da CPI. O senhor concorda com isso?

Se você acompanhar o nosso trabalho, você vai ver que nós estamos em uma linha de independência. Inclusive, ficou demonstrado isso na própria votação em que um governista de carteirinha, que é o Ciro Nogueira [senador pelo Piauí, presidente nacional do PP), que está com o governo e tudo, não votou na minha candidatura à presidência. Então, a gente tem uma linha de independência. Você deve ter visto os meus requerimentos, eles são para buscar a verdade, tanto de eventuais ações e omissões do governo federal, como também para buscar a verdade sobre as centenas de bilhões de reais de verbas federais que foram enviadas para estados e municípios. O que a gente quer é buscar toda a verdade, e não apenas uma parte da verdade. É preciso um equilíbrio. O próprio plano de trabalho que foi feito pelo grupo dos oposicionistas, e, aí, diga-se de passagem, a gente respeita, e tudo, mas o plano minimizou muito essa questão de estados e municípios na proposta de trabalho deles.

Quais são suas prioridades em termos de investigação?

A gente quer buscar o que aconteceu no Amazonas, a gente vai também chamar os ministros da Saúde, o [ex-ministro Henrique] Mandetta, o [ex-ministro Nelson] Teich, o [ex-ministro Eduardo] Pazuello, por ordem cronológica, assim como também ouvir a PGR [Procuradoria-Geral da República], que é uma peça fundamental nisso aí. São dois requerimentos: o do [senador e vice-presidente da CPI] Randolfe [Rodrigues], que teve 32 assinaturas, e que focava só o governo federal; e o meu, que teve 45, a maioria dos senadores, a partir de uma mobilização popular espontânea. Porque o meu pedido, quero deixar bem claro, foi feito no dia 2 de março. Para o meu requerimento, eu estou recolhendo assinaturas desde o dia 2 de março. Não é uma coisa de agora, depois da decisão do [ministro Luís Roberto] Barroso, [do Supremo Tribunal Federal]. Já vinha nesse foco, para apurar a verdade. Então, os dois requerimentos foram anexados, e o trabalho da CPI tem que ser livre.

Que outros depoimentos o senhor considera importantes?

No meu plano de trabalho eu chamo a PGR, que eu acho fundamental. Por que a PGR? A subprocuradora Lindora Araújo, ela pediu aos governadores informações sobre hospitais de campanha. São vários eventos. Se pegar vários estados, você vai ver que teve hospitais que foram levantados, e gastos milhões. Vou te dar um exemplo: Fortaleza [CE]. Eu relacionei outros municípios também. Lá em Fortaleza foram quase R$ 3 milhões, funcionou cinco meses, começou a chover denúncias, e, aí, da noite para o dia, eles desmancharam o hospital. No momento em que a população mais precisava, não encontrou hospital, agora, na segunda onda. Então, a gente precisa entender isso. Isso aconteceu em vários estados, e a procuradora Lindora Araújo mandou para vários governadores pedindo esclarecimentos sobre isso. Todos os estados que tiveram hospitais de campanha que foram desmanchados antes da segunda onda. A própria subpocuradora-geral deu uma declaração à imprensa dizendo que os governadores não cumpriram o prazo, demoraram para responder. E quando responderam, ela já anunciou que havia irregularidades. No requerimento da CPI, eu relatei 18 estados que tiveram operações da Polícia Federal. Foram dezenas de operações; em alguns estados houve até três operações. São fatos determinados. A gente quer ouvir o Ministério Público, a gente quer ouvir o Tribunal de Contas da União, porque essas operações foram feitas a partir de verbas federais.

Que outra suspeita de irregularidade nos estados chama a atenção do senhor?

Meu requerimento da CPI pede a convocação do secretário-executivo do Consórcio Nordeste [Carlos Eduardo Gabas]. O Consórcio Nordeste tinha uma coisa que a gente precisa buscar informações. Foram comprados 300 respiradores, no auge da pandemia do ano passado, e esses respiradores não chegaram até hoje. E os estados [do Nordeste] adiantaram esse valor [R$ 48,7 milhões]. E um detalhe curioso: foram comprados de duas empresas ligadas à indústria da maconha [uma delas é a HempCare, especializada em óleos medicinais produzidos a partir da erva]. Aí, você me pergunta: ‘O que é que tem maconha com covid e com respirador?’. Eu não sei, mas eu gostaria de entender. Isso ficou conhecido no Nordeste como o ‘calote da maconha’. Então, nós estamos chamando todos os secretários estaduais de Saúde do Nordeste.

A compra desses respiradores foi feita com recursos federais?

É isso que a gente precisa saber.

Por que o senhor insiste que a CPI tome o depoimento do ministro Marco Aurélio, do STF?

Nós também estamos chamando o ministro Marco Aurélio, convidando, respeitosamente. Por que a gente acha importante? Não foi dele a decisão de abril do ano passado tirando atribuições do governo federal e repassando para estados e municípios? A gente não quer discutir a decisão dele, não é isso. É saber o monitoramento que o STF deve ter para saber se essa atitude diminuiu o impacto de mortes, se aumentou, qual é a base. Porque o grande aprendizado também é que essa CPI pode, além de trazer toda a verdade da gestão da pandemia, tanto do governo federal quanto dos estados e municípios, deixar um legado para que a gente aprenda com os erros eventuais, tanto dos estados quanto do governo federal para as próximas pandemias que podem vir. Porque, segundo especialistas, virão outras pandemias.

E em relação ao governo federal, quais são suas prioridades?

Meus requerimentos estão lá. Então, é ouvir o ministro da Saúde; todos, o Mandetta, o Teich, o Pazuello. Eu peço dados sobre a questão de Manaus, do oxigênio. E aqui, no Distrito Federal, o presidente [Jair Bolsonaro] fez algumas visitas aqui na região, nas cidades satélites, e eu acolhi um requerimento de um colega, o Izalci Lucas [senador pelo PSDB do DF], sobre a questão das andanças do presidente, supostamente causando aglomeração. E a gente quer investigar isso também, sempre dando a ampla defesa, o contraditório. Não é julgar estados e municípios, julgar o governo federal, mas a gente quer fazer um trabalho independente, de verdade.