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Ministro Moro no país das narrativas

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O Brasil, mais uma vez, depara-se com um assunto tomado pela guerra de narrativas: o projeto de lei recentemente apresentado pelo Ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro. A referida proposta normativa passou a ser criticada ou defendida com argumentos que refletem, em parte, a polarização política do país. Destarte, parece razoável analisar alguns pontos da proposição à luz dos objetivos almejados e do ordenamento jurídico nacional.

Primeiramente, saliente-se que, a despeito de ser chamado de Projeto de Lei Anticrime, a proposta trazida a lume pelo Ministro tem por finalidade primária a edificação de um sistema punitivo mais eficiente. É óbvio que a diminuição da prática de crimes pode ocorrer de modo secundário pela mudança legislativa, pois, na raiz de práticas ilícitas, existem outros fatores, especialmente de cunho moral e social, que fogem ao campo de ação do aludido Ministério. Diante de tal constatação, a ação de Moro parece adequada em relação ao fim almejado, modificando estruturalmente um campo que não lhe cabia na anterior função de magistrado. Em parte, a opção pela mudança de carreira começa a justificar-se.

Um dos pontos mais polêmicos entre as 19 medidas atina à execução provisória da condenação criminal após julgamento em segunda instância. A afirmação, em texto de lei, da possibilidade de prisão após a confirmação de sentença condenatória em grau de recurso é positiva para a sociedade, pois reduz a sensação de insegurança jurídica proveniente das diversas interpretações dadas ao inciso LVII do artigo 5º da Constituição da República. O fato de ninguém poder ser “considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” em nada impede a prisão antes do trânsito em julgado de decisão exarada no último recurso possível, como bem demonstra a existência de prisões cautelares.

A inocência prevista juridicamente não é algo vinculado à dicotomia absoluta entre a certeza da respectiva existência (inocente) ou inexistência (culpado), mas elemento cuja própria natureza presuntiva esmaece conforme o processo se desenvolve. Assim, a pressuposta inocência perde parte de sua força com a decisão de primeiro grau e sofre golpe maior e definitivo com a confirmação em recurso, situação em que a análise das questões fáticas do caso é exaurida. A mudança na Constituição é desejável para evitar problemas de exegese, mas desnecessária para que a prisão em segunda instância seja implementada.

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Outro ponto extremamente debatido nos últimos dias concerne à medida sobre legítima defesa, que prevê a possibilidade de o juiz “reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção” (alteração do artigo 23, § 2º, do Código Penal). O Ministro Moro, com tal mudança, pretende reforçar a segurança jurídica de qualquer pessoa que, dadas as condições e utilizados os instrumentos adequados, proteja a si ou a outrem de violência injusta atual ou iminente. Não há a concessão de liberdade para agredir ou matar indevidamente outra pessoa. Ao contrário, permite-se ao cidadão ou ao agente público de segurança que defenda, por exemplo, o direito fundamental à vida (previsto no caput do artigo 5º da Constituição da República) eventualmente posto em risco de modo indevido. O direito fundamental do agressor não se sobrepõe ao mesmo direito da vítima, cabendo à Justiça analisar qual deles irá prevalecer em caso de colisão que, recorde-se, ocorreu em virtude de ação daquele que suporta o efeito da legítima defesa. Direito é linguagem e, por natureza, demanda interpretação. Assim, caberá ao julgador analisar a presença de medo, surpresa ou violenta emoção na situação concreta. Análise apriorística e desvinculada de evento real serve apenas para uso político.

Em um país tomado por narrativas ideológicas que desvirtuam questões técnicas, o projeto apresentado pelo Ministro da Justiça e Segurança Pública é um passo importante na construção de um sistema jurídico penal mais eficiente. Ainda que outras medidas preventivas no combate ao crime possam ser adotadas, a proposta é condizente com a finalidade punitiva do direito penal, um tanto esquecida nos últimos tempos em favor da ideia de ressocialização. A sinalização no sentido de que ações jurídica e socialmente inaceitáveis produzirão consequências efetivas é fundamental em um país caracterizado historicamente pelo pouco apreço ao cumprimento de regras e pela impunidade. Mais importante que a dureza da lei, porém, é a certeza de sua aplicação. O Brasil não é o país das maravilhas da obra de Lewis Carroll. O coelho branco, há muito, já percebeu o atraso e enfiou-se na toca. É hora de Alice decidir o caminho que deseja seguir.

Elton Duarte Batalha é advogado, doutor em Direito pela USP e professor de Direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Sobre o Mackenzie
A Universidade Presbiteriana Mackenzie está entre as 100 melhores instituições de ensino da América Latina, segundo a pesquisa QS Quacquarelli Symonds University Rankings, uma organização internacional de pesquisa educacional, que avalia o desempenho de instituições de ensino médio, superior e pós-graduação.

Elton Duarte Batalha

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